"Década Perdida", não para a Agropecuária
05/03/2021 - 08:14h
Divulgado ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil em 2020 apontou queda de 4,1% no ano, o pior desempenho desde 1990 quando a queda foi de 4,35%, como mostra o gráfico 1, que destaca as 6 vezes que o PIB teve quedas maiores que 2,5% nos últimos 40 anos. Esses resultados são comparáveis aos da década de 1980, que ficou conhecida como a "Década Perdida". A expectativa do mercado era de -4,4% em fins de dezembro. Em 2019, o crescimento após a revisão do IBGE, ficou em 1,41%.
O ano começou com uma expectativa de crescimento modesta, de no máximo 2,35% em 13 de janeiro, porém as primeiras notícias do que estava acontecendo na cidade chinesa de Wuhan em fevereiro e as primeiras medidas de combate à pandemia no Brasil rapidamente levaram as expectativas para o lado negativo do gráfico já em março, chegando a uma expectativa de queda de 6,55 em junho e julho e se consolidando em -4,4% no final do ano.
A tabela a seguir mostra o desempenho da economia brasileira nos últimos semestres. Os piores resultados de 2020 ocorreram no 2° trimestre, quando a retração alcançou 10,9% no trimestre em relação ao 2° trimestre de 2019. Neste período, a expectativa para o resultado no final do ano estava em queda livre. No 3° trimestre de 2020 a sensação geral era de que o pior já havia passado, e isso foi confirmado pelos resultados relativamente melhores no trimestre, principalmente quando comparado ao 2° trimestre, com alta de 7,7%. O 4° trimestre, manteve essa tendência de relativa melhoria, entretanto não tão forte quanto o trimestre anterior.
Pela ótica das despesas, em 2020 observamos uma forte redução no consumo das famílias como resultado das medidas de combate à pandemia, apesar do auxilio emergencial, e do forte desemprego. No 2° trimestre de 2020, o consumo das famílias foi 12,2% menor que o 2° trimestre de 2019, queda que foi recuperada em parte no 3° trimestre, com elevação de 10,3% quando comparado com o trimestre anterior, entretanto ainda 6% menor que o 3° trimestre de 2019, já a recuperação no 4° trimestre não foi tão forte. No ano, a redução do consumo das famílias foi de 5,5%.
A agropecuária segue sua trajetória de alta e, assim, contribui para que a queda no PIB total seja menos acentuada do que poderia ter sido caso o setor não alcançasse tal resultado positivo. O PIB do setor teve alta de 2,0%, que está levemente abaixo das expectativas. Esse resultado ocorreu em um ano atípico em função dos efeitos adversos da pandemia e do impacto que a desvalorização cambial impôs aos custos de produção.
No 4° trimestre de 2020 o desempenho do setor agropecuário foi de queda de 0,4% comparativamente ao 4° trimestre de 2019 e também de queda de 0,5% em relação ao 3° trimestre de 2020.
Importante destacar que o resultado apresentado pelo IBGE leva em consideração a produção, e para promover o aumento dessa produção os produtores rurais efetuaram investimentos em pacotes tecnológicos arrojados na safra 2019/2020, e foram agraciados com um clima muito bom, o que propiciou uma ótima safra no último ano, impulsionando o resultado do PIB do setor.
Outro destaque é que algumas cadeias como frutas, hortaliças e pecuária de leite tiveram suas produções comprometidas no início da pandemia, uma vez que a população reduziu severamente o consumo naquele momento, comprometendo a renda destes produtores.
Por fim, a inclusão da atividade agropecuária como atividade essencial no início da pandemia garantiu a produção, processamento e venda da produção, assegurando a segurança alimentar tanto no mercado interno, como no internacional. Isso permitiu que o resultado do PIB da agropecuária não retraísse também, o que comprometeria ainda mais o resultado do PIB brasileiro.
A redução do consumo das famílias e, como consequência, o ritmo ainda lento de retomada geral da economia, impossibilitou um melhor desempenho da agropecuária. Entretanto, considerando a evolução na década, a agropecuária teve crescimento de 25,4%, resultado muito superior ao da economia como um todo (-1,2%), que pode ser considerada uma nova década perdida.
Os destaques positivos da produção agropecuária brasileira em 2020 foram o café (24,3%), a soja (7,1%) e o milho (2,7%), enquanto as quedas foram da produção de laranja (-10,6%) e fumo (-8,4%).
Ao longo de 2020 podemos observar uma queda significativa da economia brasileira por conta da pandemia em quase todos os setores, contudo a agropecuária cresceu e assim ampliou a participação no PIB total, segundo cálculos da CNA, subiu de 6,7% em 2019 para 7,1% em 2020. Já a participação do PIB do Agronegócio deve subir de 21,4% em 2019 para 24,5% em 2020.
Diferentemente da metodologia do IBGE, o PIB do Agronegócio calculado pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da ESALQ/USP em parceria com a CNA, estima a produção e a renda do setor. Além da atividade agropecuária, são analisadas também as cadeias agroindustriais, agrosserviços e da produção de insumos agropecuários (dentro e fora da porteira). Segundo essa metodologia, o resultado do PIB do Agronegócio em 2020 deve atingir crescimento na casa de dois dígitos.
Importante destacar também que o setor continua aumentando sua importância na economia nacional, e também mundial, em outras variáveis, notadamente exportações e empregos. As exportações do setor atingindo níveis recordes. Esse fenômeno também pode ser observado na oferta de emprego no setor, que teve o melhor resultado desde 2011, quase 62 mil novas vagas, 4,3 vezes a geração de empregos de 2019.
Para 2021 alguns fatores deverão influenciar nos resultados do ano. Para a agropecuária, o clima poderá influenciar negativamente no desenvolvimento da safra verão, trazendo reduções no volume produzido. A desvalorização cambial está pressionando os custos de produção agropecuários (na verdade de todos os setores), reduzindo a margem dos produtores rurais. Por fim, a alta nos preços dos grãos estão impactando na produção dos pecuaristas. As recorrentes altas nas rações estão sendo superiores ao crescimento dos preços das principais proteínas produzidas no país.
Na atividade global, as expectativas ainda não estão totalmente claras, já que dependem em grande parte da evolução da pandemia, da necessidade de medidas restritivas e da vacinação. Entretanto, a princípio não são positivas, ainda que não se espere resultados tão negativos quanto 2020. Contudo, observando a expectativa dos consumidores, observa-se um principio de recuperação quando consideramos o Índice de Expectativas (IE) da FGV. Esse indicador é importante, pois o consumo das famílias corresponde em média a mais de 60% do PIB.
fonte: Udop, com informações da CNA (escrita por Bruno Barcelos Lucchi e Fernanda Schwantes)