Otimistas, pessimistas e realistas
04/08/2020 - 08:33h
Imagem: Olivier_Le_Moal, de envatoelements
NY fechou exuberante. O contrato futuro de açúcar com vencimento para outubro/2020 encerrou a sexta-feira cotado a 12.64 centavos de dólar por libra-peso, 116 pontos acima do fechamento da semana passada. 25 dólares por tonelada!! Quer mais otimismo que isso? Como o real, apesar de ter ensaiado uma recuperação, fechou praticamente inalterado, os valores em reais por tonelada fecharam fortemente. O valor médio presente dos fechamentos lineares da safra 21/22 foi de R$ 1,491 por tonelada. Muito tentador para aumentar as fixações de preço. Em média, os futuros que representam a safra 2021/22 para o Centro-Sul (maio, julho e outubro de 2021 e março de 2022) apreciaram 16 dólares por tonelada. Para a safra seguinte, 7 dólares por tonelada.
Sempre há espaço para o otimismo. Otimistas e pessimistas se debatem ao longo da história da humanidade. O otimista é aquele cara que acredita que vivemos no melhor dos mundos e o pessimista é aquele sujeito que teme que isso seja verdade. Um leitor assíduo, já na segunda-feira mandou-me uma mensagem deleitando-se com o mercado em alta vigorosa justamente após meu comentário no final de semana, de tom baixista, cuja manchete era "Procuram-se Compradores". A mensagem monossilábica do simpático leitor dizia: "Achou !!!".
O mercado de açúcar age às vezes como uma máquina de triturar reputações, não há dúvidas. Mas, também, não podemos nos apegar às oscilações que aparentam sólidas, como a do açúcar esta semana que não resistem, porém à menor das intempéries.
A divulgação do PIB americano no segundo trimestre assusta. Um decréscimo de 32% que vem a provar que as estimativas do FMI (Fundo Monetário Internacional) são muito mais realistas e consistentes do que as produzidas pelos respectivos governos.
Em verdade, a semana começou com notícias extremamente positivas para o mercado de açúcar. A Indonésia autorizou a emissão de licenças para a importação de 600,000 toneladas de açúcar. A China também manifestou interesse em importar 2.1 milhões de toneladas. E isso deu gás ao mercado.
Enquanto isso, na Europa, o consumo de açúcar no mês de junho teve melhora em relação ao mês anterior e a produção será menor em função do vírus amarelo que atingiu as plantações de beterraba. Para fechar o círculo de notícias boas que afetam a oferta de açúcar, a Tailândia espera a pior safra desde 2009/2010.
No entanto, o mundo não vai ficar sem açúcar. O Brasil, que praticamente retirou 10 milhões de toneladas de açúcar do mercado internacional num intervalo de dois anos, comparativamente ao histórico de exportação brasileira, será capaz de suprir o mundo com o produto.
O Centro-Sul, como se sabe, maximizou a produção de açúcar a tal ponto que é esperado um estoque de passagem da ordem de 3-4 milhões de toneladas para o final desta safra. O etanol deverá encostar (ou mesmo superar) o preço equivalente ao açúcar até o final deste ano, em especial se a demanda por combustível tiver uma melhora substancial como ocorreu, por exemplo, com o mês de junho que foi bem melhor do que as expectativas do mercado. Mas, tem mais sobre o assunto: o real desvalorizado favoreceu a exportação de etanol. O trimestre abri/maio/junho fechou com um volume de exportação de 536.6 milhões de litros contra 305.8 milhões no mesmo período do ano passado, um acréscimo de mais de 75%.
Globalmente, julho foi um ótimo mês para as commodities de maneira geral: o café subiu quase 18%, o cacau 10%, o açúcar 5%, o algodão 4.5%. Entre as quedas, o milho 8%, o etanol 2.5% e gasolina 4.5%. Quanta notícia otimista, não é mesmo? Agora vamos virar a chave.
A economia mundial está num desastre só e a brasileira segue na mesma toada. Como dissemos nos últimos comentários, os meses de agosto e setembro vão nos dar a exata dimensão do tamanho do rombo no consumo e o que virá depois. A incerteza acerca dos rumos que o mercado vai tomar pode ter criado uma antecipação na compra dos spreads afetando a inclinação da curva de preços de NY. É apenas uma conjectura. Nesta semana apenas o outubro/20 apreciou 11 dólares por tonelada em relação ao outubro/21 e 20 dólares por tonelada em relação ao outubro/22.
O que os fundos vão fazer com a posição comprada, agora estimada em 92.000 lotes? Rolar para março/21 e tomar quase 60 pontos (13 dólares por tonelada) na cabeça ou simplesmente liquidar? Um experiente corretor em Manhattan acha que eles ainda vão adicionar mais compras e o mercado pode subir talvez uns 50-60 pontos, mas e depois?
Qual o quadro mais provável que se desenha adiante para o mercado de açúcar: a) a reforma tributária, embora longe de ser a ideal, diminuiu a volatilidade do real e algumas instituições financeiras assumem que no final deste ano a cotação da moeda americana estará em R$ 5,0000; b) a queda de consumo de combustíveis, dado que as pessoas estão trabalhando em casa e a economia está encolhendo, não aponta para cotações de petróleo acima de 40-50 dólares por barril; c) as eleições americanas vão trazer enorme volatilidade ao mercado. Trump já declarou que não vai aceitar o resultado das eleições (se as urnas não lhes forem favoráveis), portanto, podemos esperar grandes turbulências principalmente porque os ataques à China, a principal culpada de tudo, segundo seus eleitores, vai continuar; d) Índia vai exportar entre 5.7 e 5.8 milhões de toneladas de açúcar na safra que se inicia em outubro/20 e ficaria feliz com NY acima de 13 centavos de dólar por libra-peso para eles fixarem; e) consumo de açúcar em declínio e estoque de passagem alto; f) preço da gasolina no Brasil menor em R$ por litro colocando pressão na paridade do etanol.
Muito difícil manter otimismo, visto que é impossível tentar criar alguma coisa positiva de um cenário tão ruim, ou na linguagem popular, ninguém faz salada de frango com titica de frango. Usinas devem fixar preços que estão remuneradores e consumidores industriais devem ter paciência para as compras.
fonte: Udop, com informações da Archer Consulting (escrita por Arnaldo Luiz Corrêa)