Pesquisadores defendem economia ambientalista para superar crise da pandemia
02/06/2020 - 08:18h
Imagem: Banco de Imagens
Em uma teleconferência sobre os rumos do Brasil e do mundo pós-pandemia, cientistas de várias instituições brasileiras apontaram os rumos que eles acreditam que o mundo precisará tomar para se recuperar desta crise sem precedentes e resolver os problemas criados no ciclo recente de crescimento.
Segundo o grupo, o roteiro passa pela construção de novas rotas de desenvolvimento econômico baseadas na valorização e na valoração da biodiversidade e dos serviços prestados pela natureza (ecossistêmicos), como o fornecimento de água e a regulação climática.
"É fundamental a compreensão de que a conservação da biodiversidade e o desenvolvimento econômico não são processos antagônicos, mas interdependentes. Desenvolvimento não é viável sem uma base de sustentação dos processos naturais que geram os serviços ecossistêmicos, também conhecidos como contribuição da natureza para o bem-estar humano", disse Cristiana Seixas, professora da Unicamp e membro da coordenação da Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES).
A produção em larga escala de alimentos, fibras têxteis e madeira, entre outros itens, pela rota atual, tem impactado diretamente na expansão de áreas de cultivo agrícola e de pastagem para áreas naturais em biomas brasileiros, como a Amazônia.
A fim de desacelerar a perda de áreas naturais, minimizar as mudanças climáticas e favorecer o desenvolvimento sustentável em longo prazo, será preciso promover mudanças em políticas públicas, nos padrões de consumo e investir em novos modelos de produção agropecuária que conservem a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos.
Além disso, será necessário desenvolver sistemas de produção industrial que operem em uma lógica de economia circular, evitando a poluição ambiental; investir na produção de energia renovável, saneamento básico e tratamento de efluentes, de modo a evitar a poluição de corpos d'água; e valorar a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos nos processos econômicos, apontou Seixas.
Estímulo à economia verde
A crise econômica gerada pela covid-19 deve resultar em uma retração de 5% a 10% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial, que em 2019 foi de US$ 87 trilhões.
Essa redução da atividade econômica global - da ordem de US$ 5 trilhões a US$ 10 trilhões - é equivalente a perda de três a cinco vezes o PIB do Brasil, o nono maior do mundo, estimado em US$ 1,8 trilhão, comparou Carlos Eduardo Young, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ): "Teremos uma crise de desemprego que certamente não tem paralelo no mundo pós Segunda Guerra Mundial".
As crises econômica e fiscal - marcada pela queda de arrecadação de impostos - geradas pela pandemia devem resultar em um aumento dos gastos públicos dos países, voltados a apoiar atividades que contribuam para a recuperação de suas economias. Os critérios para a concessão desses incentivos devem levar em contar atividades que contribuam para o desenvolvimento de uma economia verde ou de baixo carbono, que não piorem as condições socioeconômicas atuais, avaliou Young.
"O risco agora é que, em vez de ser desenhado um conjunto de incentivos econômicos que melhorem as condições socioeconômicas, se regresse ao modelo econômico anterior à pandemia, que é predatório e gera desemprego," afirmou.
Na opinião de Eduardo Brondizio, professor da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, o momento atual representa uma janela de oportunidades para repensar a trajetória de desenvolvimento econômico e social do planeta: "Estamos em um momento crítico em que, de maneira sem precedentes, os países vão começar a investir, subsidiar e ajudar a recuperar vários setores da sociedade. Temos a oportunidade de escolher novos caminhos ou reforçar os existentes e que só servem aos interesses de grupos particulares."
Falta de governança
Segundo Bráulio Dias, professor da Universidade de Brasília (UnB) e ex-secretário da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), os avanços da ciência nas últimas décadas permitiram o desenvolvimento de soluções para reverter o processo de perda da biodiversidade global.
O que é preciso é ter boa governança, que assegure o cumprimento de leis ambientais, o funcionamento de instituições voltadas à preservação do meio ambiente e a tomada de decisões fundamentadas na razão e na ciência, avaliou.
"Infelizmente, hoje, no Brasil, por exemplo, estamos vendo um desmonte das instituições e das políticas ambientais e uma tentativa de subverter e reverter a legislação, sem dar ouvidos aos argumentos da razão e da ciência. Obviamente que esse comportamento vai resultar em grandes prejuízos coletivos, para a sociedade brasileira e para o mundo, especialmente porque o país é o detentor da maior biodiversidade no mundo," avaliou Dias.
fonte: Inovação Tecnológica, com informações da Agência Fapesp