Relator resgata PEC Kamikaze no lugar da dos combustíveis para blindar governo
30/06/2022 - 09:49h
A troca poderia blindar o governo Jair Bolsonaro (PL) de questionamentos jurídicos por conceder novos benefícios em ano de eleição, o que seria uma infração da legislação eleitoral.
A PEC dos Combustíveis (PEC 16) foi proposta pelo líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ), enquanto a PEC Kamikaze (PEC 1) é de autoria do senador Carlos Fávaro (PSD-MT) e Alexandre Silveira (PSD-MG).
Pelas medidas transferidas agora para a PEC Kamikaze, o governo pretende destravar programas sociais, identificados pela campanha de Bolsonaro como fundamentais para recuperar a desvantagem nas pesquisas de intenção de voto para presidente, liderada por Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O principal alvo é zerar a fila do programa Auxílio Brasil, além de aumentar para R$ 600 o valor do benefício neste ano. Para permitir a elevação de gastos em ano eleitoral, a estratégia será decretar estado de emergência.
A decretação é necessária do ponto de vista legal para criar um programa novo, que é o auxílio para os caminhoneiros autônomos. O programa pagará R$ 1.000 para os transportadores autônomos cadastrados na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) até 31 de maio. O custo é de R$ 5,4 bilhões.
Serão beneficiados cerca de 870 mil profissionais, registrados até a data de corte de 31 de maio. O relator decidiu não incluir na proposta o pagamento também para caminhoneiros ligados a transportadoras, como chegou a ser discutido.
O senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), que era o relator da PEC dos Combustíveis e vai relatar o novo texto, afirmou que a decretação de emergência vai valer apenas para os benefícios previstos na proposta de emenda e que não será um “cheque em branco”.
Segundo ele, a mudança foi articulada com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A votação era esperada para esta quarta, 29, mas os senadores não se convenceram de que o texto não se configuraria em um cheque em branco para o governo. Por isso, pediram e obtiveram o adiamento da votação da proposta, prevista agora para quinta-feira, 30.
O ponto mais polêmico estabelecia que as medidas não estariam sujeitas a “qualquer vedação ou restrição prevista em norma de qualquer natureza”. Durante a sessão em que ocorreria a votação, muitos senadores protestaram e o relator concordou em retirar o dispositivo. Mesmo assim, ainda havia dúvidas sobre a falta de restrições e por isso houve o adiamento.
“Parece, pelos pronunciamentos, que todos concordam com as medidas que estão sendo colocadas, desde que haja segurança em relação a não se tratar de um cheque em branco que seja expressão pura de irresponsabilidade fiscal, o que não faríamos no Senado Federal”, afirmou Pacheco, ao decidir pelo adiamento.
Vaivém nas propostas do governo
A PEC dos Combustíveis previa inicialmente repasses de R$ 29,6 bilhões em compensação para estados que optassem por zerar as alíquotas de tributos sobre os combustíveis.
Na semana passada, no entanto, governo e lideranças do Senado começaram a articular a transformação da proposta em um pacote de benefícios. O principal argumento era a falta de sinalização por parte dos estados de que reduziriam os impostos para obter a compensação.
A PEC 1, por sua vez, havia sido apresentada em fevereiro para tentar socorrer os profissionais impactados com a alta dos preços dos combustíveis. Ela passou a ser chamada de Kamikaze porque seu impacto seria superior a R$ 100 bilhões.
O relatório de Bezerra será, portanto, atrelado à PEC 1, mas ele vai apresentar um novo texto – chamado de substitutivo, no processo legislativo – e que não deve conter as medidas previstas na PEC Kamikaze.
“A PEC 16 perdeu seus objetivos. Analisando a apresentação de outras matérias conexas, identificou-se que a PEC 1, dos senadores Carlos Fávaro (PSD-MT) e Alexandre Silveira (PSD-MG), tinha mais a ver com o espírito que hoje domina dentro do Senado, que é o da concessão desses benefícios”, afirmou Bezerra.
Em evento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) na manhã desta quarta, 29, a pré-candidata do MDB à Presidência, Simone Tebet (MS), defendeu a criação de um crédito extraordinário para subsidiar setores estratégicos. “Já criamos crédito extraordinário para dar calote, crédito extraordinário para fazer graça, para bancar o orçamento secreto. Então nós temos que fazer crédito extraordinário, o mercado assimila isso quando há caso de interesse nacional e relevância”, disse.
Ela citou especificamente caminhoneiros e motoristas de aplicativos. “Caminhoneiros, sim. Acho que neste momento é preciso garantir minimamente aqueles que estão nos aplicativos, dependendo, e são 1,5 milhão de trabalhamos que precisam ter subsídio”, acrescentou.
“O gás de cozinha, porque as nossas mulheres estão trocando o gás por carvão. Então dentro dessas regras, não sei o que virá ou quais são os excessos que podem ter [no relatório da PEC], mas no sentido macro, acho que essa tinha que ser a primeira e a única ideia”.
O maior gasto dentro das medidas anunciadas hoje é o de zerar a fila do Auxílio Brasil e aumentar em R$ 200 o valor do benefício até o fim do ano. Com isso, 1,6 milhão de famílias passarão a ser atendidas pelo programa turbinado. O custo total é de R$ 26 bilhões.
A PEC também dobra o valor do auxílio gás, que passa a ser de R$ 120 a cada dois meses. Até o momento, ele é cerca de R$ 60 por bimestre. O custo da medida é de R$ 1,05 bilhão.
Outros R$ 2,5 bilhões vão para a gratuidade para idosos no transporte municipal e os R$ 3,8 bilhões foram reservados para que estados produtores de etanol possam compensar desonerações no combustível.
O Senado já aprovou no início deste ano proposta prevendo a gratuidade no transporte público municipal. Na ocasião, prefeitos pressionaram que a medida era vista como essencial para evitar o “tarifaço”, o reajuste da tarifa de transportes.
A proposta, no entanto, acabou engavetada pela Câmara dos Deputados. Além do transporte urbano e metropolitano, o montante contempla repasses também para os sistemas de transporte público semiurbano, inclusive o existente entre municípios de uma mesma Região Integrada de Desenvolvimento Econômico (Rida), como o existente no entorno do Distrito Federal.
Fonte: novacana